segunda-feira, 24 de novembro de 2014

Patrimônio

Um jovem advogado foi indicado para inventariar a patrimônio de um senhor recém-falecido. Segundo o relatório do seguro social, o idoso não tinha herdeiros ou parentes vivos. Suas posses eram muito simples. O apartamento alugado, um carro velho, móveis baratos e roupas puídas.
“Como alguém passa toda a vida e termina só com isso?”, pensou o advogado. Anotou todos os dados e ia deixando a residência quando chamou-lhe a atenção um porta-retratos sobre um criado-mudo.

Na foto, estava o senhor, ainda era jovem, sorridente.  Ao fundo, um mar muito verde e uma praia repleta de coqueiros. À caneta, escrito bem de leve no canto superior da imagem, lia-se “sul da Tailândia”.
Surpreso, o advogado abriu a gaveta do criado e encontrou um álbum repleto de fotografias. Lá estava o senhor em diversos momentos da vida, com ar de felicidade, em fotos tiradas em todos os cantos do mundo.

Em uma casa de tangos na Argentina, diante do Muro de Berlim, em um tuk tuk no Vietnã, sobre um camelo com as três famosas pirâmides egípcias ao fundo, tomando vinho em frente ao Coliseu, encantado com a Torre Eiffel, fingindo acertar o relógio de pulso diante do Big Ben, com a mão erguida no convés de um barco e a Estátua da Liberdade num canto...
Na última página do álbum, um mapa, quase todos os países do planeta marcados com um asterisco vermelho, indicando por onde o velho tinha passado. Escrito à mão, no meio do Oceano Pacífico, uma pequena poesia:

Não construí nada que me possam roubar.
Não há nada que eu possa perder.
Nada que eu possa tocar,
Nada que se possa vender.

Eu que decidi viajar,
Eu que escolhi conhecer,
Nada tenho a deixar
Porque aprendi a viver.

terça-feira, 28 de outubro de 2014

Por Nuno Graça.

Depois da verdadeira destilação de opiniões na minha timeline contidas, exarcebadas, “hechas em Cuba” ou “made in Miami”, só digo: O Rio de Janeiro é, realmente, um grande retrato da diversidade espacial brasileira. Como geógrafo, é um prato cheio e tanto. Ainda adolescente já me deliciava em desvendar os diferentes rincões espalhados pelo município, mesmo ciente das dificuldades que iria encontrar. São tantas realidades distintas compartilhando a mesma área que poderíamos dizer que a cidade carioca é uma paisagem síntese dessa diversidade. Se por um lado, o contraste harmônico no encontro entre o mar, floresta e cidade é eternizado nos cartões postais e distribuído como imagem da cidade e do próprio país pelo mundo, outras formas de diversidade dentro do espaço carioca são menos aclamadas, para quando dizer, ignoradas. É a favela em frente aos prédios de classe alta, é o menino fazendo malabarismo no sinal no meio dos carros, é a Zona Norte de casas espalhada pela planície, de costas a uma Zona Sul edificada e espremida na orla, ao mesmo tempo concentrada e concentradora. Quase um efeito luz e sombra. Um contraste Norte/Sul ou Sudeste/Nordeste. Desafiei a lógica que orienta o cidadão da Zona Sul a ignorar essa concentração e a ir atrás de novos elementos espaciais que participam da dinâmica urbana carioca além do túnel e que, em muitos casos, passam ignoradas por quem “não é da área”. As eleições, no entanto, servem para evidenciar elementos, opiniões e, especialmente, preconceitos que sempre existiram sob a flor da pele e entranhados nos modos da população. Adoramos julgar, mas nos colocar na pele do outro, alguém se habilita? Não entendo como votam em A ou em D é o que mais li no FB, mas procurar uma explicação para isso, poucos fazem. Posso pelo menos colocar um motivo forte para cada lado. Por um lado, por mais que muitos façam manha, é inegável que houve uma evolução nos últimos 10 anos que se concerne a estrutura urbana da cidade, especialmente em locais bem carentes. BRT, Vila Carioca, Teleférico, novos trens, UPAs, escolas, vilas olímpicas. O princípio das UPPs. Basta pegar o street view do Google e ir à Estrada do Itararé dentro do Alemão ou na Estrada da Gávea dentro da Rocinha. E com isso chegam novos atores, públicos ou privados, inserindo a lógica do mercado. Obvio que 10 anos não acabariam com mais de um século de desigualdades sociais, mas dá pra notar o avanço. Por outro lado, o aumento do custo de vida, que pode ser percebido desde a prateleira de supermercado até a tabela de imóveis no jornal, passando nessa escala por cada elemento da economia, e também na paisagem: É aluga-se pra cá, vende-se pra lá, é estabelecimento na esquina fechando as portas. No final sobra para a população como um todo, mesmo que em diferentes impactos para cada indivíduo, e reflete na aprovação final de cada governo. Esse dois dos motivos que mais ouvi nas ruas, no transporte e, para cada um eles tem o seu peso, se justificam ou não é critério de cada um. O que precisa é menos ódio e mais respeito. Não adianta vir com papo de separatismo agora porque isso não resolve nada. Quem sabe seja pelo menos possível rebaixar o muro invisível entre os Rios, aquele tão protagonizado na campanha do Lindberg?
E antes que perguntem, votei em Aécio, não pelo chavão de mudanças (nem falo de corrupção porque sei que é farinha do mesmo saco), mas porque acho que essa fase de investimentos em programas sociais irá perder fôlego caso a inflação continue a crescer e o baixo crescimento econômico persista. Agora, só me falta esperar que o segundo mandato da Dilma me contradiga. E antes que digam, prefiro ir para Nova Iorque do que Miami.


terça-feira, 28 de janeiro de 2014

A AGONIA DE ARARIBOIA

Por Marcelo M. Rezende

Sempre gostei de Niterói, cidade que frequento desde 1990.
Belas praias, gente bonita, natureza exuberante, gastronomia excepcional, a cidade escolhida por Oscar Niemeyer para a concretização de um conjunto de obras de valor inestimável e que fazem dela um local mais que especial por este diferencial!
Em outubro de 2010, por conta de meu trabalho e por ter chegado ao fim meu período em Guapimirim, tornei-me morador da cidade que tanto admirava pelos atributos supracitados, alugando uma casa em Santa Rosa. Entretanto, uma coisa é ser um outsider eventual, outra é morar em um determinado local integrando-se em seu dia-a-dia, descobrindo o modus vivendi de sua gente, os hábitos, o pensamento, as coisas boas e ruins...
Do ranking de 4º lugar do IDH no Brasil (Índice de desenvolvimento humano) conseguido nos anos 90, hoje, temos uma cidade com gravíssimos problemas de mobilidade urbana e infraestrutura fruto da inexistência de politicas publicas no tocante a grandes obras de acessibilidade e viárias que solucionassem este problema. Aliás, o mesmo gestor que “revolucionou” a cidade – José Roberto Silveira – sendo prefeito por 16 anos (quatro mandatos não consecutivos) foi o responsável pela destruição de tudo ou quase tudo o que ele mesmo construiu...
Difícil imaginar o que se passa na cabeça de um gestor público que consegue tamanha proeza, mas não me aterei a comentários, pois temos de ter um olhar no futuro...
Niterói tem em comum com o Rio, a topografia com os “mares de morro” e, portanto, graves problemas com captação e canalização das águas da chuva; minha rua no bucólico bairro de Santa Rosa vira um rio em dias de chuva! Aliás, este bairro lembra-me o Grajaú no Rio, com muitas arvores, casas antigas, algumas centenárias e que estão sendo derrubadas pela especulação imobiliária. A velocidade que se constroem espigões em Santa Rosa é inacreditável e a verticalização da cidade é um problema não observado pela municipalidade: num determinado espaço geográfico onde havia 4 casas com 4 famílias com no máximo 20 pessoas, passou a ter 200 famílias com 800 pessoas vivendo neste mesmo espaço, isto sem a menor estrutura necessária!
Gostaria de saber como estas construtoras conseguem autorização para construir tanto e tão rapidamente...!
Desnecessário dizer que a capacidade de carga do local pelo numero de pessoas em circulação, da demanda de energia elétrica, água encanada e esgotos não suporta esta abrupta mudança, mesmo porque não existem estruturas que aguentem e suportem o aumento da demanda e do consumo.
O resultado é visto claramente após uma chuva de verão: os córregos que são muitos em Niterói e que recebem descargas diretas de esgoto doméstico dos condomínios sem nenhum tratamento explodem em cataratas de excrementos que deslizam pelas ruas da cidade! Alguns destes desaguam na praia de Icaraí apelidada por meu sobrinho de “praia do cocô”.
A rua Dr. Sardinha vira um lamaçal fétido digno de um “Paris Dakar” e nem os ônibus da viação Araçatuba da linha 30 andam por ali, tomam outro caminho para chegar a seu destino final.
Se a atual gestão municipal não investir pesado em obras de infraestrutura e com isso quero dizer, rede de esgotos e drenagem da chuva, viadutos, túneis visando melhorar a mobilidade urbana, em muito pouco tempo Niterói entrará em colapso e não se poderá andar mais de carro pela cidade e, principalmente em sua zona sul, devido às ruas estreitas e entupidas de carros...
É verdade que a atual gestão recebeu um legado negativo e pesado e torço para que consigam realizar um bom trabalho e recolocar Niterói em seu devido lugar, trazendo assim um pouco de Paz ao destemido espirito de Araribóia e a seus munícipes!