sábado, 9 de junho de 2012


Negócios do Brasil - Nelson Motta

Hoje qualquer alfabetizado digital com um cartão de crédito pode fazer uma reserva no hotel que quiser pela internet, sem pagar comissão a ninguém. É o que milhões de pessoas fazem no mundo inteiro.
Como são esperados 30 mil visitantes para a Rio+20, o Itamaraty resolveu fazer uma licitação para uma só agência centralizar todas as reservas - e ganhar sozinha todas as comissões. São cerca de 300 mil diárias durante 10 dias. Uma comissão de 10% sobre uma diária média, modesta, de R$ 400, já seria um faturamento de R$ 12 milhões.
Só faz sentido uma agência ter exclusividade para as reservas de hotéis em um grande evento se for para diminuir os custos com a operação centralizada e conseguir, pelo volume, descontos dos hotéis e repassá-los, em parte, aos clientes; ou então para explorar impunemente os otários indefesos.
A sede foi maior do que o pote e a fonte secou: com a faca, o queijo e a máquina de cartão de crédito na mão, a agência Terramar estava mordendo R$ 504 numa diária de hotel cinco estrelas vendida a R$ 1.560, e R$ 261 nos quatro estrelas, que vendiam a R$ 948. Depois de protestos internacionais, foi obrigada pelo governo a devolver as comissões abusivas e liberar 10 mil quartos bloqueados. Foi constrangedor.
E um diretor da Terramar ainda veio dizer que é normal uma agência receber comissão de 25% sobre uma diária. Pelo trabalho de mandar um e-mail com a reserva e um número de cartão de crédito. Em que lugar do planeta agências ganham 25% do valor de uma diária para reservar um quarto? Só no Brasil, que não por acaso tem hoje os hotéis mais caros do mundo - e as agências mais espertas. Imaginem na Copa do Mundo, com uma agência escolhida pela Fifa, CBF e Ricardo Teixeira?
Nelson Rodrigues chamava um bom negócio, uma oportunidade de ouro, de "negócio da China", "galinha morta", "negócio de pai para filho caçula". Ficaria horrorizado em saber que as galinhas mortas (e congeladas) são hoje um dos nossos principais produtos de exportação e que agora, quando um chinês tenta vender a outro uma pechincha, diz em mandarim: "É uma moleza. Um negócio do Brasil!”.

Estadão O Globo 25/05/2012

domingo, 25 de março de 2012


Dialogo entre aluno e professor sobre Patrimônio Cultural.

- “Fessor”, hoje eu e meus amigos pichamos aquela estátua do anjo que fica na entrada do túnel novo em Copacabana... sabe colé?
 - sim Cazuza, eu sei qual é a estátua! É a mesma que vira e mexe é vandalizada por pessoas que não tem consciência coletiva e não respeitam o bem publico! Você devia se envergonhar de realizar tal ato!
- Mas fessor, tem gente que já decepou a cabeça dela um zilhão de vezes, já cortou as asas mais umas quantas, acho que esta estátua está lá para ser zoada mesmo! Hahahaha!!!
- Que coisa mais triste Cazuza! Olha, senta aqui eu vou te explicar uma coisa. Tudo o que vemos nas ruas e praças de nossa cidade são bens coletivos, ou seja, pertence a todos nós! Alguns destes bens têm uma história, um passado que está relacionado com vários aspectos da formação e da evolução de nossa sociedade como um todo. Se falarmos de uma igreja que possui 200 anos, nós visualizamos através da própria construção, do estilo arquitetônico dentro e fora da igreja, o que aquelas pessoas produziram naquela época e que de certo modo, conseguiram transmitir estes valores, formas, pensamentos através do tempo até os nossos dias e isto nos mostra como eles viviam e pensavam e como estes valores influenciam a nossa sociedade atual. Entende?
- OK fessor, mas me diga uma coisa, se esse troço que acabou de dizer é verdade, como é que daqui a 200 anos, “os pessoal” do futuro verão as “gostosas da gaiola das popozudas?”
- Não se diz “os pessoal”, mas sim “as pessoas”. Não sei ao certo, isto dependerá do impacto e da profundidade que estas pessoas produziram no consciente coletivo de nossa sociedade atual e se isto terá desdobramentos para as gerações futuras, ou se cairá no esquecimento...!
- ih, já vi que o Fessor não é chegado numa bunda!?
- mas qual é o valor de uma bunda?
- Ih fessor, o sr. tá viajando na parada...!
- Estou nada, me diga então o que é um bunda prá você?
- Uma bunda é uma bunda, ora!
- Ok, mas a bunda em questão, o que ela ou a sua “dona” produziu para a sociedade? Será que foi apenas uma bunda ou foi uma bunda que deixou um legado pela produção artística da mente que estava acima dela?
- Fessor, agora o “meu tico e teco” estão dando nó!!??
- Tudo que o ser humano produz é um bem coletivo da humanidade, seja uma obra de arte material ou imaterial! Você por acaso consegue “pegar” uma musica?
- Claro que não!
- Então, mas quando você escuta uma melodia bonita e agradável e se tiver uma letra que “case” perfeitamente com a melodia, você escuta várias vezes até gravar a letra e sair cantando não é?
- É sim!!!??? Ainda mais se for do Claudinho e Buchecha!!!
- Existem musicas que tem 300 anos e que quando são tocadas causam uma série de sentimentos em quem as escuta, entende? Isto se diz que é cultura, ou seja, a produção registrada da mente dos seres humanos que se estende através da linha do tempo, chegando até os nossos dias e que ainda nos influenciam e emocionam!
- Hum, sei, fala mais Fessor...!
- É importantíssimo guardarmos e protegermos tudo o que é fundamental para que estes registros não se percam e assim possamos passar adiante as maravilhas geradas pelos mais variados gêneros humanos ao longo da historia e em toda a sua gama de criação artística. Lembra-se da aula de historia, quando vimos as pinturas rupestres na Espanha e na Serra da Capivara no Piauí?
- Lembro sim, foi quando descobri que o Piauí existe...
- Estas pinturas na rocha transmitiram valiosas informações de como vivam aquelas comunidades há milhares de anos e nós jamais saberíamos disso se elas não tivessem sido protegidas, catalogadas e estudadas!
- É mesmo, nunca havia pensado desta forma!
- Então você vai me prometer que nunca mais vai destruir, quebrar, sujar, partir, pichar e vandalizar nenhum bem publico, ok?
- Já é Fessor! Mas como é importante esta coisa do proteger e preservar a nossa identidade não é?!
- É Cazuza, pois como você bem sabe, “o tempo não para, não para não, não para...!” 

Chelo Rezende